Quando eu era criança, minha avó ficava me contando suas intermináveis histórias. E em Fevereiro de cada ano era sempre a mesma coisa: carnaval.
Nascida e criada na Lapa, ela dizia que os melhores bailes eram ali. Bastava andar um pouco e já estava na Rio Branco, palco de blocos que pregavam a felicidade, e irreverência e que faziam a festa. Andando menos ainda recebia as boas vindas dos Arcos, e lembrava, saudosista, a pura carioquice do lugar.
Recordava-se também das mulatas faceiras e dos malandros que as perseguiam incessantemente com fervor e adoração. Fantasiada de bahianinha, ia brincar nas escadarias que desembocavam em Santa Teresa, espalhando confete, serpentina e muita alegria. Nas casas, as janelas abertas serviam de moldura aos rostos de senhoras que riam, em aprovação.
Mais para a esquina, estirado no chão, o bêbado de ontem, quiçá de anteontem, sobre o chão frio e duro, antes o chão das marchinhas. A correria era uma só: pai e mãe chamavam, já ia sair o bloco. As freiras do convento próximo passavam depressa, e logo estavam longe, andando a rápidas passadas. Fora ensinada que carnaval não é coisa de Deus, mas mesmo assim o aproveitava.
E o tempo sempre passa, eu ouvindo e ela falando. E passou mesmo: veio a época de mocinha (menina-moça, disse ela), moça feita, os filhos. Eles também brincaram o carnaval, mas não tão intensamente.
Ah, minha avó suspirava de saudade. Sentada em sua cadeirinha, majestosa, ela refletia: quanta vida!
4 comentários:
Adoro textos memorialistas, saudosistas... posso até ver o olhar distante da sua avó, perdido em meio as suas recordações.. Lindo!
Ficou ótimo querido.
Beeijos
E depois de tanto fogo, as cinzas. Bendita quarta-feira.
Beijos.
Foi outro presente da Rachel!
Ela que fez pra mim!!!
^^
Ei! Ah, eu te dei um selo. Passa no blog pra buscar.
Beijo.
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